terça-feira, 30 de outubro de 2007

Religião - Teologia comparada - Mitos religiosos

Texto de Fátima Tardelli

Colaborou: André Carvalho
(web page: http://ceticismo.wordpress.com/ )



O animal humano vive junto de seus pares tanto por uma necessidade interior de contato com outros de sua espécie quanto para aproveitar a comodidade e segurança que este tipo de vida proporciona.

É tarefa relativamente fácil imaginar como foi o quotidiano dos primeiros homens: antes que dominasse a tecnologia de agricultura (mesmo que forma rudimentar), a terra se mostrava inóspita e pouco propensa a fornecer o quanto necessário à sobrevivência humana; por carecerem de explicações plausíveis, as forças da natureza (trovões, chuvas, p.ex) causavam-lhes verdadeiro terror; a morte (realidade natural), envolta em mistérios; tudo contribuindo para a criação de uma atmosfera ‘mágica’ onde o desconhecido travestia-se de ‘divino’.

Atendendo à necessidade de fornecimento de explicações a tais fenômenos, o animal humano criou uma série de ‘mitos’ e assim foi com todas as civilizações existentes; todos os agrupamentos humanos, de uma forma ou outra, criaram mitos que explicavam tanto os fenômenos naturais quanto a criação do homem.

Uma sumária análise de tais mitologias proporciona ao leitor a percepção da existência de elementos similares (de ‘mitos’) nos mais díspares ou distantes grupos humanos.

A exemplo citamos:



a) o mito da criação do homem pelo barro, por uma força divina - ao contrário do que muitos crêem, tal concepção não é exclusiva da mitologia hebraico/cristã[1], podemos encontrá-la, exemplo, na mitologia de um povo africano denominado iorubà[2], bem como na mitologia grega. Enquanto o deus hebraico Yaveh teria criado o homem da terra, o deus ioruba Oxalá teria criado o homem do barro, mesmo tipo de criação que teria sido efetuada pelos deuses na mitologia grega.[3].


Fig. 1 - Deus iorubà "Oxalá"





Fig. 2 - A criação do homem

Michelângelo, Capela Sistina


b) o mito do dilúvio (impossível de ter ocorrido*), tanto na mitologia hebraica (deus Yaveh) quanto na inca (o deus inca Viracocha teria ordenado aos homens que vivessem em paz/ordem/respeito, mas a desobediência humana teria levado o deus a despejar sobre os homens um dilúvio, no qual todos teriam perecido).

Fig. 3 - O dilúvio bíblico












Fig.4 - Deus Inca "Viracocha"


c) o mito do jardim do éden (local onde o homem vivia feliz, livre da dor e do sofrimento e sem precisar viver à custa de seu trabalho) é deveras semelhante à Idade de Ouro da mitologia grega[4] (onde o deus Crono, apesar de violento, presidia uma raça de homens que também não precisava trabalhar, pois a terra, mesmo não sendo cultivada, produzia fartamente o necessário à sobrevivência humana - curioso notar que na narrativa, cita-se que os homens não necessitavam de roupas).

Fig. 5 - Deus Grego Crono



Fig.6 -Jardim do Éden












d) a concepção da figura feminina como elemento essencial na questão da ‘queda’ do elemento masculino – conceito encontrado tanto na narração do ‘pecado original’ (Adão e Eva), descrito na mitologia hebraica, quanto na mitologia grega, onde Zeus teria criado uma criatura irresistivelmente encantadora que causaria a desgraça dos homens[5] (Pandora).


Fig. 7 - Pandora



e) mitologia relativa a um salvador do povo escolhido – podemos encontrá-la na figura de Moisés, essencialmente semelhante à figura de Obaluayé, figura que teria sido atirada a um rio por sua mãe (Nana Buruku) e resgatada por uma outra deusa (Yemója)[6].




Fig. 8 - Moisés




Fig.9 -Deus Iorubà "Obaluaê"









f) a idéia do julgamento dos homens pelos deuses – pode ser encontrada também em várias civilizações, citando como exemplo apenas a hebraico/cristã (os homens seriam julgados por Yaveh, sendo os justos levados ao céu e os injustos jogados ao inferno), quanto na mitologia grega (onde os mortos seriam julgados de acordo com a sua vida passada e, conforme seus erros, eram postos em diferentes lugares)[7].


Fig. 10 - O Julgamento Final
Em geral as religiões são éticas, mágicas ou a soma de ambas; as éticas buscam estabelecer valores nos quais as ações humanas têm de se pautar, enquanto que as mágicas buscam a manipulação do sobrenatural para modificação da natureza das coisas.

O homem sente extrema dificuldade em abandonar a crença na dicotomia entre o bem e o mal, expurgando sua própria natureza, que, a nosso ver não é essencialmente boa ou má, apenas a atuação do ser humano se concentraria na busca do prazer e da maior distância à dor. O abandono desta crença equivaleria a livrar-se dos ‘grilhões’ (crença em mitos espetaculares).

A ‘criação’ de heróis/deuses, sejam eles ícones religiosos ou não, busca o atendimento da necessidade humana de crer que sua essência é boa, similar à do herói-deus (feito à imagem e semelhança).

Caso o texto supra tenha feito surgiu interesse sobre o assunto, recomendamos que acesse o texto de autorida de André Carvalho (web page: http://ceticismo.wordpress.com/2007/10/10/jesus-cristo-e-super-homem-a-necessidade-do-heroi-mitico/ ), nele o autor constrói interessante ponte entre a figura de Jesus Cristo e o Superman.



Bibliografia/Notas:
[1] Vide Gênesis
[2] PRANDI, Reginaldo, Deuses africanos no Brasil: uma apresentação do candomblé
[3] POUZADOUX, Claude, Contos e Lendas da Mitologia Grega, São Paulo, Ed. Cia das Letras, p.15
[4] Idem, p.13
[5] Ibidem, p.14
[6] PRANDI, Reginaldo, A dança dos encantados, e Deuses africanos no Brasil: uma apresentação do candomblé

[7] POUZADOUX, Claude, ob cit, p.26

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